Nos últimos anos, a expansão do ensino de medicina no Brasil tem gerado discussões sobre qualidade, mercado e regulamentação. Com o aumento expressivo de faculdades, principalmente no setor privado, o curso passou a movimentar bilhões de reais, tornando-se uma oportunidade de negócio para instituições de ensino.
Desde 1990, o número de faculdades de medicina quintuplicou, totalizando 390 cursos, dos quais mais de 80% pertencem ao setor privado. O programa Mais Médicos, lançado em 2013, impulsionou essa ampliação ao incentivar a abertura de novas vagas, tornando o ingresso nas universidades públicas ainda mais competitivo. Assim, a busca por alternativas privadas cresceu, mesmo com mensalidades elevadas.
O mercado educacional viu a ascensão de grandes grupos como Ânima, YDUQS e Afya, que investiram bilhões na compra de faculdades. Enquanto outras áreas enfrentaram queda na demanda, a medicina continuou como uma escolha atrativa devido ao prestígio da profissão, à estabilidade do mercado e à possibilidade de definição dos próprios rendimentos.
No entanto, o crescimento acelerado gerou preocupações sobre a qualidade da formação. Em 2018, o Ministério da Educação (MEC) suspendeu a criação de novos cursos e o aumento de vagas, alegando que os objetivos de expansão haviam sido atingidos e que era necessário preservar o padrão do ensino. Desde então, muitas faculdades passaram a recorrer à Justiça para viabilizar suas operações.
Em 2024, seis universidades foram notificadas pelo MEC por oferecer cursos sem autorização oficial, realizando vestibulares com base em decisões judiciais provisórias. No ano anterior, das 6,3 mil vagas abertas no país, 3,5 mil foram criadas por meio de liminares.
Especialistas, como Mario Roberto Dal Poz, da UERJ, alertam para os riscos da judicialização do ensino, questionando se a qualidade da formação está sendo devidamente considerada nesses processos.
Enquanto isso, o Conselho Federal de Medicina (CFM) não se manifestou sobre o tema, e a Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP) preferiu não comentar, alegando que a questão ainda está em julgamento.
Diante desse cenário, cursar medicina no Brasil continua sendo uma decisão relevante e estratégica. No entanto, os desafios impostos pela comercialização do ensino e pela regulação do setor exigem reflexão e cautela por parte dos futuros profissionais, que devem analisar não apenas o potencial da carreira, mas também a qualidade das instituições disponíveis.